domingo, 19 de janeiro de 2025

POESIA VENEZUELA PALESTINA * Fundação Claudino Silva/Brasil

POESIA VENEZUELA PALESTINA
COLETÂNEA

AOS INTERESSADOS, 
faremos uma coletânea de poesias e o tema é VENEZUELA e PALESTINA. Não precisa ser texto inédito, nem sobre os dois temas no mesmo texto. Desde que o poema seja sobre um desses países ou sobre ambos, será bem vindo. 

Nosso livro será um ebook, sem fins lucrativos e com registro de direitos autorais na BIBLIOTECA NACIONAL. Portanto, cada autor será honrado com a publicação de sua obra dentro das normas oficiais. 

A escolha do/s tema/s se deve ao fato desses dois países estarem passando por situações muito parecidas. Um, invadido desde o século dezenove por países imperialistas que vem mantendo, a duras penas, é verdade, o seu domínio sobre os povos habitantes da TERRA, conhecida como PALESTINA. 
O outro, VENEZUELA, desde a instalação da colonização espanhola, vem enfrentando problemas de tipo parecido, como o bloqueio econômico e o desrespeito a sua soberania, aliás conquistada com o sangue do seu povo sob a liderança de SIMÓN BOLPIVAS, impostos pelo imperialismo yanke liderado pelos ESTADOS UNIDOS.

POR ISSO, propomos este projeto aos seres humanos dignos dessa definição, e os convidamos para se empenharem conosco nessa jornada.

A remessa dos trabalho pode ser feita via email: fundacaoclaudinosilva@gmail.com 

Não temos prazo de envio nem quantidade limite de trabalhos. Mas alertamos que serão escolhidos os textos que considerarmos mais significativos. 

TODOS PODEM COMEÇÃO AGORA!

UN POEMARIO HOMENAJE A LOS HÉROES DE LAS RESISTENCIAS * Luis Alfonso Mena / Periodismo Libre

UN POEMARIO HOMENAJE A LOS HÉROES DE LAS RESISTENCIAS
 Luis Alfonso Mena / Periodismo Libre
Mauricio Vidales Giraldo, escritor colombiano exiliado en Alemania, dialogó con Luis Alfonso Mena, de Periodismo Libre, sobre su más reciente libro: ‘20 Poemas del exilio y una canción esperanzada’, lanzado en Cali. “Nuestra poesía es la vitalidad renovadora de los pueblos”, dijo. Vidales habló también sobre cómo encontró a Colombia, sus esperanzas respecto de los cambios que se han operado y de su lucha en el exterior.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

A guerra dos murais * Faber Raven/COL

A guerra dos murais
Faber Raven

Uma guerra única estourou em uma cidade muito organizada. Não foi com pedras ou tanques, foi entre escovas e rolos, arte contra a infertilidade.

A cidade – muito visitada por estrangeiros e nacionais – permaneceu vestida com os trajes mais brancos, bandejas de prata brilhante, serviços de segurança impecáveis.

A ordem do prefeito ficou bem clara desde sua posse: “Sem sujeira! É preciso que tudo esteja limpo, desinfetado como o Metro, desprovido de sugestões, sem símbolos ou metáforas, sem bandeiras estranhas, sem alegorias ou opiniões.”

Os rolos começaram a guerra. Eles lançaram suas primeiras saraivadas de acrílico cinza cobrindo frases e grafites de lembranças infelizes. Continuaram com pichações em paredes e bancos, com placas de parceiros em parques e bairros, depois com murais de uma revolta social.

Os pincéis responderam à afronta à liberdade pintando no local onde estava escrita a frase “Estão nos matando” outra frase em letras grandes: “A arte não cala”.

Mas os rolos logo voltaram e tornaram o mural acinzentado.
Os pincéis voltaram à briga. Desta vez pintaram uma enorme cratera cheia de caveiras e ossos. Arte com filosofia, arte poderosa. “A maior vala comum a céu aberto da América. Atenciosamente, as cuchas”, intitularam.

Não demorou 24 horas para os rolos chegarem e em pouco tempo cobriram aquele mural que levou 12 horas para ser concluído.
Não demorou para que o muro voltasse a ser intervencionado pelos pincéis que, entre juntas e cumbias, desenhavam uma barragem rodeada de arame farpado. Arte da memória, arte pura. Eles o chamaram de “Hydrofango, a maior trincheira aquática da América”.

Desta vez os rolos esperaram, agachados atrás das árvores; Assim que os pincéis foram retirados, começaram a cobrir o mural ainda fresco com tinta mais densa e escura.

Quem disse “desistimos”. Ninguém! Pelo contrário, mais pincéis uniram forças e começaram a pintar murais por toda a cidade. O muro onde se concentrava a discórdia amanheceu com a frase em tinta neon que dizia: “Cidade inovadora na narcogovernança”.

Ordenaram no corredor sombrio que aquele mural fosforescente não brilhasse nem por uma noite. Tal como os anteriores, as suas cores vivas que atraíam até os pássaros desapareceram.

Mas as equipes de rolos não foram suficientes para cobrir tanto mural que cobria a cidade arrumada. Na parede de uma longa ponte apareceu a frase: “O bordel infantil mais populoso do mundo”. Num depressivo podia-se ler: “Débora Arango voltou a pintar as 300 mil pessoas que vão para a cama todas as noites sem comer”. Num muro abandonado: “Gonzalo Arango apresenta cadeira elétrica para moralistas”. Nas paredes de vários hotéis: “Turismo sexual: só euros”, ou “Bem-vindo ao Vale do Silício”. Na parede de diversas escolas: “Monitorado e punido. “Um fascista está nos perseguindo.” Essa cidade é uma loucura. Frases e murais lindamente pintados em todos os cantos, nas paredes e divisórias das ruas, nos canteiros, nos rodapés deteriorados. O espaço público voltou a ser público, a cidade estava viva, vibrando com as suas verdades artisticamente expressas.

Os rolos entraram em pânico. Eles estavam perdendo a guerra. Eles não sabiam o que fazer diante de tantos murais. Ao verem as frases “Cidade moldada com farinha branca” e “Por mais que lavem, vai deixar de ser roupa suja” pintadas em letras grossas, explodiram de uma raiva que não conseguiram conter. Antes de começarem a limpar e lavar o que chamavam de sujeira, equipes de radiotelefonias que faziam a guarda do espaço público, fecharam a entrada das pracinhas que tinham as duas últimas frases com cercas metálicas. Não permitiam a entrada de vendedores ambulantes, artistas de rua ou engraxates. Os visitantes estrangeiros foram aconselhados a retornar mais tarde, pois estavam atendendo a uma emergência.

Os rolos se multiplicaram por milhares, o prefeito e seus colegas contrataram mão de obra que esperava sentada em frente aos murais porque naquela cidade eles sabem onde vai parar de repente o pouco trabalho. O que há para fazer? Assim, em uma semana conseguiram resgatar a boa imagem, sim, apagaram todas as mensagens da vista do público.

De não acreditar. Cientes da perda de todos os murais, os pincéis fizeram tréguas. Desta vez, eles respiraram fundo, planejando uma única frase para pintar pela cidade. Chegaram com calma aos pontos de intervenção, dançaram, tomaram sorvete e contaram histórias da memória histórica para melhor realizar a tarefa. Depois de preparadas as tintas intensamente coloridas, escreveram em letras maiúsculas a frase “A sujeira está na alma, nenhum detergente limpa”.

Os cinegrafistas chegaram cansados ​​aos novos murais, seus rostos pareciam desconcertados, seus espíritos desanimados. Eles tiveram que ser empurrados por capatazes. Tanques com baldes, vassouras, esfregões, barris de tinta cinza, trapos e mangueiras foram baixados de caminhões e carros. Em seguida, esfregaram com escovas, despejaram água, secaram com compressores, enrolaram os rolos com uma camada grossa, repetiram a tarefa, mas a placa ainda estava legível e completa. Eles não conseguiram apagar uma única letra daquela frase.

14 de janeiro de 2025


O belo e o horrível

Prefeito, você apagou a pichação que dizia “as cuchas têm razão” porque Medellín não ficou bonita?

Lacan disse que o inconsciente é a política, ao que Dufour acrescentou: “… e a política é estética”. Mas prefeito, o feio é encontrar os corpos por aí, em qualquer lixão, o horrível é assassinar centenas de pessoas, sem julgamento, na mais absoluta impunidade, e jogar fora os corpos, fazendo-os desaparecer. Roubar não só as suas vidas, mas também a sua identidade, a sua história, a sua memória; despojando-os do rito e do sepultamento, deixando os enlutados sem possibilidade de concluir o luto e a sociedade sem possibilidade de elaborar o conflito, condenando-a a repetir a rodada de violência armada. Isso é horrível.

Então, prefeito, a partir do seu ódio, da sua ignorância e do seu despotismo você ilustrou essa relação entre o inconsciente, a política e a estética: a diferença de julgamentos entre o que é belo e o que é horrível mostra a distância entre o fascismo e a democracia. É compreensível que você não suporte o fato de que essas paredes não parem de olhar para você, que te assediem.

E sim, as cuchas estavam certas; A sua dignidade, o seu amor e o seu compromisso com a verdade são mais que belos, são da ordem do sublime. Se você pudesse conversar com os seus, provavelmente diria a eles que apagar aquela pichação é mais feio do que bater na sua mãe.

Retirado de uma parede.

Desonesto Morales, infame pseudojornalista, canalha e miserável.
Porta-voz do fascismo negacionista.

ANEXOS
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quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO * Juan Carlos Monedero/Espanha

CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO

"NOTA

Já imaginou se você descobrisse que vive num campo de concentração? 

Ou se você descobrisse que na casa ao lado da sua tem um campo de concentração. Um campo de concentração secretíssimo, onde todos os prisioneiros se fazem passar por pessoas livres, senhoras de si, esbanjando bem-estar, só pra disfarçar a submissão em que vivem?

Pois é. É isso que eu quero lhe convidar para conferir, por que eu acredito que muitos de nós vivemos em campos de concentração, 
disfarçados de mundinhos confortáveis, vivendo nossas vidinhas alienadas.

VEM COMIGO! "
JUAN CARLOS MONEDERO
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sábado, 11 de janeiro de 2025

Fernanda Torres, o Itáu e a Ditadura * Alexander Ceci/SP

Fernanda Torres, o Itáu e a Ditadura
Alexander Ceci

Parabéns a Fernanda Torres pela premiação em função do excelente filme "Ainda estou aqui"! Mas, sendo "estraga prazeres", lembro: Walter Salles, o diretor do filme, é herdeiro no Itaú-Unibanco, sendo por isso o cineasta mais rico do mundo.

Voltando na história, o banco Itaú foi um dos principais financiadores da "caixinha" da Operação Bandeirantes (OBAN), que tinha também a Federação da Indústria do Estado de São Paulo (FIESP) e como articuladores políticos Paulo Salim Maluf e Delfim Netto. O famigerado criminoso e torturador, o delegado Sérgio Fernando Paranhos Fleury, trabalhava para a OBAN.

A OBAN matou Carlos Marighella, em 04 de novembro de 1969, através de Fleury. A OBAN também fez surgir o Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI). O DOI-CODI do Rio de Janeiro funcionava na Polícia do Exército, na rua Barão de Mesquita, no bairro da Tijuca.

Após saber que o ex-deputado federal cassado pela ditadura Rubens Paiva teria um encontro com Carlos Alberto Muniz da direção do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), o DOI-CODI o prendeu, assim como a sua esposa Eunice e uma das suas filhas, na PE da Tijuca (ler "Cachorros", Marcelo Godoy, que relata a infiltração de agentes da repressão na esquerda da época).

Lá Rubens Paiva foi barbaramente torturado e assassinado e o seu corpo desapareceria até hoje. Já o Itaú, que em 1965, ocupava a 150ª posição no ranking dos bancos brasileiros, depois de dez anos de regime militar, em 1975, se tornou o 2° maior banco do país.

Seu dono, Olavo Setúbal, conspirador do IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas ) e do IPES (Instituto de Pesquisa de Estudos Sociais) antes do Golpe de 1964, depois virou prefeito biônico da maior capital brasileira, São Paulo, em 1975, indicado que foi pela ditadura.

Já Walther Moreira Salles, pai do cineasta Walter, foi por duas vezes embaixador brasileiro nos EUA e ministro da Fazenda no governo João Goulart. Ao contrário da grande maioria dos empresários ligado a Jango, Walther pai sobreviveu ao golpe, pois era unanimidade entre os golpistas como também nos EUA, mentor da derrubada de Jango. Walther era amigo de Rockfeller e de Lincoln Gordon, o embaixador ianque no Brasil e conspirador de primeira linha do golpe. Delfim assegurava que qualquer cisma contra Walther era besteira.

Diga-se de passagem, os dois principais ganhadores da reforma bancária imposta pelos banqueiros em 1965 foram Olavo Setúbal e Walther Moreira Salles. Tanto que através do seu banco de médio porte, em 1966, o último criou o Banco de Investimento do Brasil, com sócios americanos. E passou a comprar diversos bancos até adotar o nome de UNIBANCO, em 1974. Em 1991, Walther pai comprou parte do Nacional, propriedade da família Magalhães Pinto, cujo patriarca foi governador de Minas Gerais e foi outro golpista chefe em 1964. Em 2008, Itaú e Unibanco formaram um só banco, mas as suas digitais estavam nas duas décadas de triste memória do nosso país.

O filme "Ainda estou aqui", apesar disso tudo, não perde a sua extrema validade, principalmente nesse momento de bolsonarismo; de Trump; de Javier Milei; do genocida Benjamin Netanyahu; do crescimento da extrema-direita e por denunciar um crime hediondo, que dá impulso para denúncia de outros tantos crimes hediondos feitos pela ditadura, cujos corpos não apareceram como o de Rubens Paiva.

Mas, não deixa de ser bem irônico e típico dessa democracia dos ricos e dos bancos, ver instituições que estiveram por detrás da criminosa "Revolução de 1964" (como o Itaú ainda chamava o Golpe na sua agenda de... 2014) estarem no DNA da fortuna do diretor que produziu "Ainda estou aqui". Em resumo: um banqueiro "sensível" vira ícone nacional. Só falta ter trio elétrico para ele. Tira o tubo!

Por fim, os festejos com a premiação do filme feitos pela mafiosa Rede Globo (que cresceu o seu império com a ajuda das botas dos milicos, e que defendeu a ditadura até o último momento, procurando, inclusive, esconder a Campanha das Diretas em 1984) são uma cusparada na cara daqueles que preservam a memória dos 21 anos do sanguinário regime militar. 
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sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

A Servidão Moderna * Jean-François Brient / Youtube

A SERVIDÃO MODERNA
Da série Filmes & Documentários Revolucionários

Título Original: A Servidão Moderna

Sinopse: 

“A servidão moderna é uma escravidão voluntária, consentida pela multidão de escravos que se arrastam pela face da terra.

Eles mesmos compram as mercadorias que os escravizam cada vez mais.,,,

Eles mesmos procuram um trabalho cada vez mais alienante que lhes é dado, se demonstram estar suficientemente domados.

Eles mesmos escolhem os mestres a quem deverão servir. Para que esta tragédia absurda possa ter lugar, foi necessário tirar desta classe a consciência de sua exploração e de sua alienação. Aí está a estranha modernidade de nossa época.

Contrariamente aos escravos da antiguidade, aos servos da Idade média e aos operários das primeiras revoluções industriais, estamos hoje em dia frente a uma classe totalmente escravizada, só que não sabe, ou melhor, não quer saber. Eles ignoram o que deveria ser a única e legítima reação dos oprimidos e explorados.

Aceitam ordeiramente sem discutir a vida lamentável que as classes dominantes planejaram e seguem planejando para eles. A renúncia e a resignação são a fonte de sua desgraça.”

COMENTÁRIO

Um bom documentário, crítico, denuncia a alienação que se recrudesceu neste período do capitalismo quando foi feito o filme, relativamente recente.

 As críticas, as sacadas do autor quanto às formas de dominação e alienação contemporâneas, são muito boas mesmo. A crítica à mercadoria e sua fetichisação estranhada, são muito sugestivas. 

Suas limitações se dão, quando claramente vemos uma certa desilusão em relação ao proletariado e suas possibilidades de alcançar o comunismo. Na verdade, a limitação maior do autor vem no final, quando ele propõe uma saída utópica de tipo anarquista, para superar o capitalismo, que ele chama no filme, de sociedade mercantil. 

Mas no todo, apesar das sérias lacunas, vale a pena assistir, pois trás boas críticas e valiosas reflexões.

Roberto Bergoci - SP
JEAN-FRANÇOIS BRIENT/YOUTUBE

quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

OSWALD DE ANDRADE VIROU DOMÍNIO PÚBLICO * Edison Veiga/Deutsche Welle

OSWALD DE ANDRADE VIROU DOMÍNIO PÚBLICO

"Agitador" e "genial": o legado de Oswald de Andrade, que entra em domínio público em 2025. O legado de Oswald de Andrade, que virou domínio público.

Especialistas avaliam trajetória e escritos do modernista morto há 70 anos, e destacam obras essenciais para conhecê-lo. Em fevereiro, gigante da literatura nacional ganha nova biografia.

"Este quadro é sensacional. É o homem plantado na terra", disse Oswald de Andrade (1890-1954) tão logo ganhou, de aniversário, uma tela de Tarsila do Amaral (1886-1973), com quem era casado. Depois, com a ajuda de um dicionário de tupi, encontraram os termos "aba", homem, e "poru", que come.

Assim foi batizado aquele que se tornaria o mais importante quadro da história da arte brasileira, "Abaporu". Esta história, contada por Tarsilinha, sobrinha-neta da artista, no livro Abaporu: Uma obra de amor, ilustra bem a ebulição intelectual de Oswald, uma das mentes criadoras por trás da Semana de Arte Moderna de 1922.

O poeta, escritor, ensaísta, dramaturgo e grande agitador cultural Oswald de Andrade terá sua obra em domínio público a partir de janeiro — pela legislação brasileira, que prevê o fim da incidência de direitos autorais a partir do ano seguinte ao 70º aniversário de morte do autor. Com isso, mais editoras devem republicá-lo e novos holofotes devem ser lançados sobre sua produção.

Será uma oportunidade para que o trabalho dele seja revisitado — muitas vezes sua vida, movimentada e cheia de amores, costuma ser mais destacada do que sua obra.

"[Ele] era um autor essencialmente confessional, que transfigurava a própria biografia em termos de ficção e poesia", analisa o jornalista e biógrafo Lira Neto, que lança em fevereiro Oswald de Andrade: Mau Selvagem. "Impossível tentar compreender sua obra desligada de sua própria existência. E vice-versa."

Vida "maior" que a obra?

O sociólogo e crítico Antonio Candido (1918-2017) dizia que a biografia de Oswald havia sido tão importante quanto sua obra. "Mas, na verdade, se conhece muito pouco de sua trajetória", afirma Lira Neto. "Muito se comenta sobre a Semana de 22, que para mim é um episódio eventual, quase marginal, diante do turbilhão que foi a vida dele."

Há os notórios romances, principalmente os casamentos com Tarsila e, depois, a escritora e militante comunista Pagu (1910-1962) — mas também mulheres como "Landa, Daisy, Pilar Ferrer, Julieta Barbara, Maria Antonieta d'Alkmin", enumera o biógrafo.

"Quase não se fala do Oswald pensador, autor de teses originais e atualíssimas sobre a cultura. Quase não se fala do Oswald jornalista, agitador permanente. Quase não se fala do Oswald na intimidade, feroz e lírico, ateu e crente em Nossa Senhora, anjo romântico e incorrigível devasso", completa.

Em sua biografia, Lira Neto promete não fazer julgamentos morais, apenas apresentar "o homem genial que foi Oswald, com todas as suas ambivalências: virtudes e vícios, qualidades e defeitos, acertos e erros".

"O inconformismo intelectual e o espírito de rebelião fez com que, por vezes, Oswald tomasse atitudes impensadas e praticasse gestos de exacerbada violência contra amigos próximos. Incapaz de exercer a monogamia, ao mesmo tempo ciumento ao extremo, magoou a grande maioria das mulheres com quem viveu", destaca.

Para especialistas, essa conjunção entre vida e obra é que fez de Oswald um gigante da literatura nacional. "A vida dele foi também uma obra, teve plástica, estética, natureza artística", diz o escritor e professor universitário Miguel Sanches Neto, reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). "Ele foi um homem-arte, como aqueles homens-sanduíches que carregam no corpo as mensagens. Ele foi um homem-reclame, um homem-sanduíche do modernismo."

Autora do livro Semana de 22: Entre Vaias e Aplausos, a jornalista e escritora Marcia Camargos diz que Oswald "criou um personagem um pouco folclórico", pela sua "figura cativante, meio histriônica, de um glutão, de alguém sem meias palavras".

"Mas eu não acredito que isso seja maior do que sua própria obra e nem que abafe parte. Um está imbricado no outro e ele era realmente um artista, um escritor extremamente criativo", avalia, frisando que ele respondia às questões de seu tempo "de forma genial". "Não penso que sua personalidade tenha se imposto e obscurecido, feito sombra à sua obra."

Livros de destaque

Mas se o domínio público é a oportunidade de novas edições, os especialistas têm também suas recomendações sobre quais obras merecem ganhar mais espaço nas prateleiras — e quais funcionam como porta de entrada para que um leitor mergulhe na literatura oswaldiana.

Lira Neto destaca de forma geral os poemas, "em especial os do maravilhoso Primeiro Caderno de Poesia do Aluno Oswald de Andrade, ilustrados por ele mesmo, e os do volume Poesias Reunidas de O. Andrade, trocadilho brincalhão com as Indústrias Reunidas de F. Matarazzo [complexo fabril que marcou época em São Paulo no início do século passado]". "O uso do coloquialismo na poesia, o poema-pílula, o poema-piada, tudo aquilo me parece profundamente contemporâneo", frisa.

Autora do livro Rupturas e Desdobramentos: Reverberações Críticas da Semana de Arte Moderna e professora na Universidade Estadual Paulista (Unesp), Maria Lúcia Outeiro Fernandes situa a obra de Oswald como "um dos maiores legados do modernismo brasileiro, pois representa a concretização das principais propostas de 22".

Ela destaca, de forma geral, os livros de poesia da produção oswaldiana, "especialmente o Poesia Pau-Brasil". "Das narrativas, o livro que apresenta maior afinidade com os leitores contemporâneos me parece ser Memórias Sentimentais de João Miramar", diz a professora. Este último é classificado pela jornalista Camargos como "imbatível".

O poeta e tradutor André Capilé, professor de literatura brasileira na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), destaca outras duas facetas de Oswald que mereceriam ser revisitadas editorialmente.

"Talvez, muito talvez, nos falte uma reunião crítica da obra dramatúrgica [dele]. Edições reunidas e anotadas que deem maior vulto a essa dimensão autoral do autor, que apesar das revisões e montagens de O Rei da Vela, na presença viva de Zé Celso [Martinez Corrêa (1937-2023)], terem dado novo vigor e visibilidade à dramaturgia oswaldiana, talvez fosse o caso de uma nova mirada diante das demais peças", comenta ele.

O outro gênero trazido por Capilé é a produção ensaística. "Os textos reunidos de jornais e conferências que encontramos em Ponta de Lança, com suas polêmicas e modos de refletir, por contonar aspectos de seu tempo e por terem sempre uma linguagem ágil e ácida, definitivamente nos mostram não só como Oswald pensava a cultura, mas também demonstram como sua composição textual flagrava o mundo", explica.

Sanches Neto mira no próprio autor. Neste sentido, vê o autobiográfico Um Homem Sem Profissão como inovador e precursor do gênero de autoficção, tão em voga na literatura contemporânea. "Para mim, é o livro mais importante publicado por ele", comenta.

O escritor também considera essencial a obra Diário Confessional, reunião de textos que o autor registrou em diários, publicada em livro em 2022. "Ele solta todo o seu fel, todo o seu rancor e, ao mesmo tempo, toda a sua poesia na avaliação de seus contemporâneos", afirma Sanches Neto.